Nós, abaixo assinados, participantes da 30ª edição do Curso de Verão, “Educar para a Paz em Tempos de Injustiças e Violência”, curso organizado na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP, de 06 a 14 de janeiro de 2017 e promovido pelo Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e Educação Popular – CESEEP, chocados com as chacinas de detentos nos presídios de Manaus AM e Boa Vista, RR, e com a falência do Estado em assegurar a integridade física das pessoas sob sua custódia, queremos denunciar o sistema carcerário e toda a engrenagem do sistema penal. Nunca cumpriram e nunca cumprirão as funções que declaram desempenhar, quais sejam: reinserir e reeducar. Cabe notar que boa parte dessas pessoas encarceradas nem sequer foram investigadas, indiciadas e muito menos processadas, julgadas e condenadas,
É impossível que os objetivos de reinserir e educar sejam alcançados num ambiente de privação de liberdade, de violação de direitos e da dignidade humana e permanente utilização de diferentes modalidades de tortura física e psicológica. Na prática, o sistema punitivo-repressivo e as prisões são mecanismos que têm como alvo as parcelas da população que historicamente tiveram negado seu acesso às políticas sociais e ao mínimo de sobrevivência digna. São mecanismos, enfim, de manutenção e garantia da ordem socioeconômica que privilegia alguns poucos em detrimento das maiorias, na logica do neoliberalismo globalizado.
A política de encarceramento massivo das pessoas pobres funciona num Estado que se colocou a serviço das elites econômicas. Opera na lógica penal e policial, que oprime e violenta a população das periferias. O Estado brasileiro está pautado pela seletividade punitiva do Poder Judiciário, pelas políticas de (in)segurança do Poder Executivo, pelo recrudescimento penal das decisões do Poder Legislativo. Essa mesma seletividade, que acarreta a letalidade e truculência das polícias, ancorada na estrutura socioeconômica excludente, produziram o Massacre do Carandiru em 2 de outubro de 1992 e a escandalosa absolvição dos seus responsáveis 25 anos depois. Nesse meio tempo, sucederam-se outras chacinas: Vigário Geral, Candelária, Eldorado dos Carajás, Favela Naval, Urso Branco, crimes de maio de 2006, Pedrinhas, Anísio Jobim (Manaus/AM) e Monte Cristo (Boa Vista/RR).
Não serão planos e políticas de (in)segurança que visam a ampliação dos sistema punitivo que reverterão o cenário de massacres, mas uma profunda transformação da estrutura social combinada com amplo combate à sanha punitiva e à criminalização das camadas populares. O desencarceramento e a desmilitarização da sociedade são necessários e urgentes. Por isso, apoiamos as propostas reunidas na Agenda Nacional pelo Desencarceramento, discutidas e subscritas por centenas de organizações e movimentos sociais:
- Suspensão de qualquer verba voltada para a ampliação do sistema prisional;
- Plano plurianual de redução da população prisional e dos danos causados pelo encarceramento;
- Alterações Legislativas para a máxima limitação da aplicação de prisões cautelares;
- Mudança da criminalização do uso e do comércio de drogas;
- Contração máxima do sistema penal e abertura para a Justiça Horizontal;
- Ampliação das Garantias da Lei de Execução Penal (LEP);
- Ainda no âmbito da LEP: abertura do cárcere e criação de mecanismos de controle popular;
- Vedação à privatização do sistema prisional;
- Prevenção e Combate à Tortura;
- Desmilitarização das Polícias e da gestão pública.
“Em tempos de injustiças e violência”, a organização popular em defesa dos direitos humanos e da justiça social será fundamental para a superação do Estado neoliberal, que, por definição, é excludente, punitivo e encarcerador das/os pobres, e para a construção de novas relações sociais, comunitárias, pacíficas, livres de exploração e da busca cega por lucros. Nos somamos ao lema de Dom Paulo Evaristo Arns, grande profeta e companheiro de sonhos e lutas: de Esperança em Esperança, sempre na Esperança.
08 de Janeiro de 2017
Propostas fundamentais que apontam contra o alvo certo – a pena de prisão. É ela que precisa ser fortemente limitada para evitar os enormes danos que vem causando a toda a sociedade, ainda que muitos desconheçam seus efeitos.