Queridas e queridos,
O Brasil pós-eleições parece com um povo andando pelo deserto ainda desnorteado com a liberdade mal testada, com as tropas egípcias ainda no seu pé e gente querendo voltar para trás com saudades das cebolas. Caminhar sem mapa no deserto exige mirar estrelas.
Vamos precisar de profetas para as várias etapas que estamos a viver. Algumas e alguns são agora deputados e deputadas na luta parlamentar. Nossos companheiros para fortalecer a sociedade civil e a voz do povo organizado.
Precisamos de profetas para cidades como São Paulo que ainda vive no exílio, apesar de ter votado na democracia. Mas a maioria dos paulistas quis um miliciano de direita.
Profetas para rincões da Amazonia que sofre os abusos gritantes dos latifundiários, do trabalho escravo e da monocultura coloniais. Felizmente temos o cardeal Steiner como voz que clama em Manaus.
E, claro, para o Brasil inteiro, oxalá surjam profetisas e profetas pós exilicos na árdua tarefa coletiva e política e social e religiosa e ética, de reconstruir a democracia, a voz dos pequenos, das mulheres, dos indígenas e do povo negro. A nos fortalecer temos MST E MTST.
Recordo da voz do padre Bouzon:
“A análise da literatura profética mostra-nos, pois, que a preocupação máxima de um profeta não é predizer o futuro, o profeta não é um adivinho. Ele é, sim, um pregador que anuncia a vontade do Deus de Israel ao povo. Ele fala, portanto, conforme a necessidade do seu tempo. A preocupação de um profeta pré-exílico é condenar os abusos e as injustiças sociais que reinavam na sociedade israelita e judaica nos séculos VIII, VII e VI aC. Já o profeta exílico procura reanimar o povo exilado e sem independência política e religiosa. O profeta pós-exilico trabalha na reconstrução de Jerusalém e do país” (Emanuel Bouzon, O profetismo no Antigo Oriente e no Antigo Testamento, in: Maria Clara Lucchetti Bingemer & Eliana Yunes, Profetas e profecias numa visão interdisciplinar e contemporânea, São Paulo: Ed. Loyola, 2002,. p. 41).
Discernir a hora, o lugar e as utopias necessárias. Tarefa importante na casa, na rua, na Escola, nos sindicatos, nas associações e ongs. Em cada lugar uma palavra oportuna e lúcida. Tenho em meu olhar Dom Paulo, pastor Jaime Wright, dom Helder e dom Luciano como luminares e exemplos a seguir.
Enfrentar os fascismos e ouvir as dores do povo. As duas tarefas ao mesmo tempo pois são duas faces da mesma moeda.
Há estes destruidores do Centro dom Bosco no Rio, há os velhos e novos nazistas em Santa Catarina, há fome nas ruas, há milicianos por toda parte, há corruptos e criminosos nos aparelhos policiais, enfim, tá danado. MAS EXISTEM padres Julios e irmãs Dulces e as comunidades nas periferias resistindo e existindo e haurindo forças das raízes culturais. São as redes de jovens lutadores e das mulheres articuladas. Gente que ama e luta. Gente que partilha. Gente ecumênica das várias denominações que sabe que o amor nos une.
Há torcidas organizadas derrubando barreiras.
Ah, enfim, temos papa Francisco, agora costurando fraternidade no Bahrein.
Aleluia! Deus é misericórdia e está conosco. Bem do nosso lado. Emanuel – conosco.
Teremos que construir todo o edifício popular pedra a pedra, argamassa a argamassa, suor a suor, cantiga a cantiga. Como diz o primeiro samba: Ô, abre alas, que vamos passar! Com serenidade e paz. Com memória, justiça, verdade.
Abraços na esperança teimosa e com muita paz nas mãos e no coração.
Prof. Dr. Fernando Altemeyer Junior, assistente doutor da PUC-SP.