Assim se chama a iniciativa de vários grupos internacionais que trabalham pela justiça eco-social e por mais vida para toda a humanidade. É bom lembrar que, na antiga Grécia, ágora era o espaço público de discussões, onde os/as cidadãos de cada cidade tomavam as decisões importantes para a vida de todos. Nesse momento da vida da humanidade, parece mais importante do que nunca uma ou diversas ágoras dos habitantes da Terra.
Desde os anos 90, algumas experiências têm florescido. Em junho de 1992, no Rio de Janeiro, durante a conferência da ONU sobre o clima, movimentos e organizações sociais se reuniram no Aterro do Flamengo. Foi um encontro de cidadãos/ãs do mundo inteiro. O plenário dessa movimentação se chamava “Cúpula dos Povos”. Essa mesma experiência foi repetida no mesmo local, durante a Rio 92+ 20, em junho de 2012. A partir do levante dos índios do Sul do México, em Chiapas (1994), aconteceram três encontros que se chamaram: “Encontros da humanidade pela Vida e contra o neoliberalismo”. Esses encontros foram fecundos e provocaram a formação de uma “Assembleia Continental dos Povos” que continua ativa e se reunindo periodicamente.
Em 2001 começou o processo dos fóruns sociais mundiais com o grito coletivo que, a partir do Fórum de Montreal (2016), tem se traduzido na frase: “Outro mundo é necessário. Juntos podemos torná-lo possível”. Quase vinte anos depois do começo dessa aventura dos fóruns mundiais, em março desse ano, em Salvador, BA, esse processo se revelou vivo e interpelador. No entanto, o Fórum Social tem insistido em manter-se como espaço de articulação e discussões, mas não de decisões. O FSM nem mesmo aceita emitir declarações ou conclusões em seu nome. Isso tem o seu sentido, para deixar esse papel para cada organização de base. Mas, mesmo se o mais fundamental é garantir as iniciativas de base, muitos militantes sentem a necessidade de buscar um instrumento que dê voz e vez a toda humanidade como um coletivo. Sem substituir os organismos de articulação regional e mesmo mundial, se trata de clarear algumas bandeiras comuns a todos. A Ágora dos Habitantes da Terra propõe que se estabeleça um pacto social que envolva toda a humanidade, consciente dos grandes problemas que, nos dias atuais, a sociedade internacional e o planeta Terra estão atravessando.
Sabemos que ainda há muitos grupos humanos que ficarão fora dessa articulação. Só no Brasil, dizem que há mais de 60 grupos indígenas isolados. No mundo inteiro, nômades, ciganos, tuaregs do norte da África e nativos da Austrália ainda ficarão fora. Mas, é importante começar. Já será um desafio, mesmo entre os inseridos na sociedade, garantir a participação das diversas categorias de trabalhadores, legalizados e informais. É urgente dar voz aos desocupados, garantir o protagonismo das mulheres e das minorias sociais, raciais, sexuais e religiosas. Esses desafios são preocupações cotidianas das pessoas que, de diversos continentes, estão convidando os grupos e comunidades a se unirem nesse mutirão de cidadania planetária. Alguns encontros locais e regionais têm se feito com esse objetivo. Essas iniciativas terão um primeiro momento de encontro internacional, em dezembro desse ano, perto de Barcelona (Espanha). A primeira proposta é que grupos de base e organizações regionais escrevam cartas e mensagens à humanidade expressando suas propostas para o presente e o futuro da sociedade humana. Essas propostas serão discutidas e encaminhadas aos outros grupos e organismos ligados a essa iniciativa internacional. Vai se tentar que a própria ONU acolha e discuta essas propostas. A Ágora dos Habitantes da Terra deseja que a ONU aceite que todas as pessoas que desejarem possam ter uma carteira de identidade de “habitante da Terra”. Assim, ninguém mais poderá ser considerado estrangeiro ou clandestino se nasceu e se vive no planeta Terra.
Desde o começo do segundo século de nossa era, as Igrejas cristãs definiram que uma característica importante de cada comunidade ou grupo de discípulos e discípulas de Jesus deve ser a de ir assumindo uma dimensão católica. Esse termo grego, quase sinônimo do que hoje se chama holístico, foi traduzido por universal. Não significa ser internacional ou mundial e sim um permanente convite a abrir-se a todos. Só conseguimos nos tornar humanos/as como Jesus, se aceitamos viver uma verdadeira e profunda abertura de coração e de vida a tudo o que é humano. Por isso, os cristãos e cristãs devem sentir-se especialmente chamados/as a se unirem a toda humanidade nesse mutirão de cidadania planetária.
Marcelo Barros, monge beneditino, teólogo e biblista, assessor das comunidades eclesiais de base e de movimentos sociais. Tem 55 livros publicados, dos quais o mais recente é “Conversa com o evangelho de Marcos”. Belo Horizonte, Ed. Senso, 2018.