O teólogo, biblista e bispo emérito do Recife da IEAB (Igreja Episcopal Anglicana do Brasil), Dom Sebastião Armando Gameleira Soares, deu nesta terça-feira (12) a sua primeira palestra no 29° Curso de Verão. Ele é o quarto e último assessor desta edição do curso com o tema “Profetas e Profetizas, promotores da Justiça, na defesa dos direitos dos pobres.” Dom Sebastião falou sobre como a Bíblia nos motiva a agir e como trata o que é ser uma pessoa.
Para o teólogo, a palavra hebraica “dabar” costuma ser traduzida com o mesmo significado do grego “logos”, como verbo e palavra. Entretanto, o significado correto seria o de “ação”, o princípio de tudo segundo o Evangelho de São João. “Na Bíblia, palavra é o que faz. A palavra de Deus é o que faz acontecer”, disse. Para o teólogo, a melhor tradição existe hoje seria a palavra “práxis”, que dá ideia de prática e ação.
O bispo também falou aos cursistas que a ideia de ser humano existente hoje na sociedade, é a de indivíduo, algo isolado. A Bíblia, entretanto, dá a ideia de pessoa. “A pessoa não é o mesmo que indivíduo. A pessoa só se desenvolve na relação com as outras pessoas e com o mundo”, afirmou. “Toda pessoa nasce livre? Isso não é verdade, é uma abstração burguesa”, falou em relação a Declaração Universal dos Direitos Humanos e a injustiça social passada por gerações.
Para Dom Sebastião, a concepção individualista do ser humano foi criada pela burguesia no século XIX e acabou também incorporada pela Igreja Cristã. “Temos de nos desligar do racionalismo. A Igreja é particularmente muito racionalista. Está mais preocupada com a doutrina do que com o que acontece (na sociedade)”, declarou.
Religião
Dom Sebastião também dissertou sobre a origem do cristianismo. “A religião é uma invenção nossa. Cada um faz a sua hoje. Atualmente, tem uma igreja em cada esquina. O cristianismo está cada vez mais se desmembrando”, afirmou. O assessor falou sobre a origem da palavra grega “ecclesia”, da qual surgiu “Igreja”, que significava originalmente assembleias de cidadãos.
Segundo Dom Sebastião, São Paulo em suas cartas não citava igrejas, mas assembleias dos cristãos alternativas às oficiais e não necessariamente desejava criar uma nova religião, criada pelos seres humanos que cometem erros durante a história. “Não bastam um Concílio Vaticano II, uma Teologia da Libertação e um papa Francisco para derrubar essa montanha rochosa que separa o cristianismo e a religião criada por nós”, disse. “O cristianismo deve estar acima da religião. É preciso diferenciar a doutrina da Igreja do anúncio do Evangelho”.
Para finalizar a assessoria, o teólogo ainda falou sobre o problema da relação entre o Estado e a Igreja por meio do exemplo do arcebispo católico de Recife e Olinda, Dom Hélder Camara, que recusou ser ministro da Educação ao ser convidado nos anos 50 pelo presidente Juscelino Kubtschek. “A Igreja não deve se situar na vizinhança do poder do Estado.”
O coordenador-geral do CESEEP, padre José Oscar Beozzo, também comentou o assunto. “A Bíblia sempre nos chama e mostra que não temos de nos ajoelhar diante de nenhum poder. Somos todos filhos e filhas de Deus”, disse.
Mística
Antes da assessoria, os cursistas realizaram uma celebração pela preservação da terra e pelos índios, originais donos do território brasileiro. Cordas de barbante foram estendidas pelo Teatro da Universidade Católica (TUCA) e os cursistas as seguraram como forma de ficarem conectados.
Índios da etnia Ticuna, da comunidade Santa Clara de Manaus (AM) contaram um pouco de como é onde vivem. “A gente mantém a nossa cultura lá, preserva o meio ambiente, pois temos um cacique que nos orienta”, disse um deles, que não se identificou. A tribo tenta agora montar uma associação para vender castanhas. “Que Deus nos ajude a ter a nossa associação, bem bonita, preservando o meio ambiente.
Também esteve presente o cardeal arcebispo de São Paulo, Dom Odilo Pedro Scherer, que elogiou a proposta do curso de debater, neste ano, a economia e o meio ambiente. “Quando se entra em uma crise econômica, logo se faz sentir os efeitos sobre quem? Sobre os pobres, sobre quem não tem um emprego seguro, quem não consegue se proteger.”
Para o cardeal, a falta de justiça econômica volta ao debate em época de crise. “A economia deveria ser feita para administrar o bem para todos”, declarou.
Arthur Gandini