Angelica Tostes, do CESEEP, esteve presente no “Third CoNGO Global Thematic Webinar on Gender Justice, Youth, and Intra-/Intergenerational Justice and Solidarity for Future Generations” (“Terceiro Webinar Temático Global da CoNGO sobre Justiça de Gênero, Juventude e Justiça Intra/Intergeneracional e Solidariedade para as Gerações Futuras”) , a Conferência de ONGs em Relação Consultiva com as Nações Unidas representando a Federação Universal dos Movimentos Estudantis Cristãos na América Latina e no Caribe / The World Student Christian Federation, que aconteceu no dia 31 de agosto de 2023.
É possível ver toda a conferência no Youtube em inglês. Angelica partilhou um pouco da experiência da atuação ecumênica da juventude latino-americana, seus medos e esperanças, a partir do Sul Global. A seguir, sua reflexão compartilhada no encontro em português.
“A partir desse importante tema, quero trazer à memória o que me traz esperança, como diria o texto bíblico de Lamentações, e nisso quero convidá-los a mergulhar nas águas profundas das tradições afroameríndias de Abya Yala (terra madura em Kuna) Os povos originários nos ensinam que as águas, as montanhas, as plantas são nossas irmãs, não algo distinto de nós, e elas carregam em si as memórias de um povo. As águas, as montanhas, as plantas também fazem parte de sua ancestralidade. Assim como os povos de terreiro de religiões de matriz africana nos encantam com sua devoção à ancestralidade, com o respeito ao mais velho e essa relação tão bonita da escuta ativa através do corpo em dança.
Não poderia falar sobre Justiça de Gênero sem mencionar meu território, o Brasil. Minha teologia tem como ponto de partida o meu corpo, por isso as mulheres indígenas de Abya Yala tem reivindicado a categoria corpo-território. Esse corpo-território que no Sul Global é marcado pelas injustiças de gênero, raça, classe, sexualidade e casta que tocam o corpo das mulheres. Mas também, é um corpo-território em luta, em resistência para sobreviver e viver a vida, com seus sonhos e imaginações.
Dessa forma, entendo que é imprescindível o diálogo intergeracional na transformação desse futuro que buscamos: a ancestralidade daqueles que vieram antes de nós, que abriram caminhos para que nós caminhássemos e também transgressoras em seus limites, a escuta e o olhar para o aprendizado.
Todo corpo e todo território carregam em si as memórias de suas trajetórias, por isso é necessário essa troca atenta entre corpos, na Nossa Agenda Comum, há dois tópicos que me saltam os olhos: Protect our planet e Place women and girls at the centre. As duas coisas parecem distantes entre si, porém, estão mais perto do que imaginamos, pois esse corpo-território também sofre com a eco-injustiça. A pauta do clima incide radicalmente na sobrevivência de diversas mulheres que dependem da terra, da colheita para viver. “Se o campo não planta, a cidade não janta” é um lema dos trabalhadores e trabalhadoras do campo, que traduz a importância da agricultura familiar para o abastecimento das cidades com a produção de alimentos saudáveis e sustentáveis.
O relatório da Comissão Econômica para a América Latina e Caribe, Social Panorama of Latin America and the Caribbean 2022: Um terço da população na região vive na pobreza, que também afeta 45% de todos os adolescentes e crianças. Assim como nos anos anteriores, a Cepal destaca que a incidência da pobreza é maior em alguns grupos de população na região: a taxa de pobreza das mulheres de 20 a 59 anos de idade é mais alta que a dos homens em todos os países da região. A taxa de pobreza também é consideravelmente mais alta na população indígena e afrodescendente.
A fome tem gênero, a cor e a etnia. A Justiça de Gênero e o Futuro das Gerações será impossível sem enfrentarmos os males que o neoliberalismo faz com as terras de nosso mundo, explorando violentamente, assim como também o fazem com os corpos das mulheres desde sempre.
O resgate desse corpo-território é a busca pelas memórias de nosso futuro, memórias gestadas nos úteros e corações das mulheres de Nuestra América e todo Sul Global, que lutaram e lutam contra a fome, a opressão aos seus corpos e a exploração dos mesmos e de seus territórios. Retomo o texto bíblico de Lamentações… trago a memória o que me dá esperança, e para mim, a esperança está nas mulheres, crianças, jovens, adultas, idosas… sempre nas mulheres e à elas, saúdo a minha ancestralidade de mulheres que abriram caminhos para hoje estar aqui falando para vocês.
Obrigada