Pela primeira vez na história, diversas Igrejas cristãs e até outras religiões se unirão nessa semana para orar e meditar sobre o cuidado com a Terra, a água, o ar e todo o universo no qual nós, seres humanos somos inseridos e ao qual pertencemos. Desde a década de 70, a cada ano, o patriarca de Constantinopla propõe que todas as Igrejas Orientais dediquem o 1o de setembro como “dia de oração e cuidado com a Criação”. Em agosto do ano passado, o papa Francisco enviou uma carta a todas as dioceses pedindo que a Igreja Católica também se una a essa celebração. Por sua vez, o Conselho Mundial de Igrejas convidou as Igrejas evangélicas, membros do Conselho para entrarem nessa mesma sintonia de cuidado com o ambiente. E, nesses dias, algumas notícias da internet contam que grupos hindus e budistas quiseram também unir-se a essa iniciativa ecumênica e ecológica.
Orar e meditar sobre a natureza como criação significa contemplar nela uma presença ativa do Criador que, permanentemente, continua conduzindo o universo no rumo do seu amor. O ser humano só mudará a sua forma de relacionar-se com os seus semelhantes e com os outros seres vivos se optar por um olhar de amor sobre o universo. Ao aprofundar a relação consigo mesmo e com os outros, é fundamental pressentir uma marca divina por trás de cada ser do universo.
Atualmente, o planeta Terra abriga mais de sete bilhões de pessoas. Nos próximos 50 anos, a previsão é de que o mundo tenha entre 8, 5 a 9 bilhões de habitantes. Mas, como viverá essa população, se metade dos recursos hídricos disponíveis para consumo humano e 47% da área terrestre já são utilizados? E ainda assim mais de um bilhão de pessoas passa fome e, a cada dia, mais de 30 mil morrem por este motivo? Estudos afirmam que a relação entre crescimento populacional e o uso de recursos do Planeta já ultrapassou em 20% a capacidade de reposição da biosfera e esse déficit aumenta cerca de 2,5% cada ano. Isso quer dizer que a diversidade biológica – de onde vêm novos medicamentos, novos alimentos e materiais para substituir os que se esgotam – está sendo destruída muito mais rápido do que está sendo reposta. Esse desequilíbrio está crescendo. Até 2030, 70% da biodiversidade poderá ter desaparecido…”[1].
Apesar de tudo, uma profunda esperança brilha sobre a Terra. Ela vem do fato de que, no mundo inteiro, a cada dia, cresce o número de pessoas e grupos que aprofundam a espiritualidade e se põem em diálogo para buscar novos caminhos. O resgate da dignidade da Terra, da Água e do Ar está na ordem do dia de grupos espirituais das mais diversas tradições. As próprias Igrejas cristãs que, durante séculos, pareciam não ligar o ato criador de Deus com sua atuação salvadora na história, nas últimas décadas têm todas aprofundado essa questão. Em maio do ano passado, o papa Francisco dirigiu a toda humanidade uma carta sobre o cuidado com a casa comum. Nessa carta, ele se une a Bartolomeu, patriarca de Constantinopla, na insistência em unir o cuidado ambiental com a preocupação pela justiça social e econômica. Ao mesmo tempo, ensina que a raiz de tudo é um novo olhar espiritual sobre o universo como criação amorosa de Deus.
Na América Latina, um dos mais importantes sinais de esperança para a causa ecológica é o fortalecimento dos movimentos indígenas. Esses têm proposto como novo paradigma civilizatório o cuidado com o Bem-Viver que implica priorizar a vida comunitária, as relações humanas e a relação harmoniosa com a natureza como formas de organizar a sociedade. O cuidado com a Terra, a Água e todos os seres vivos se torna elemento central do processo social e político, assim como de uma nova sensibilidade espiritual. Todos nós somos convidados a participar ativamente dessa celebração de amor, como um casamento entre o céu e a terra.
[1] – INSTITUTO SOCIO-AMBIENTAL, Almanaque Sócio-ambiental Brasil 2008, São Paulo, 2007, p. 33.
Marcelo Barros