Nas últimas nomeações dos altos escalões, sinto uma visibilidade militar que, para os sobreviventes de 1964, nos deixa inquietos. Eu estava no Chile quando, dois dias antes do golpe, um deputado daquele país, grande amigo, me dizia: “Vocês brasileiros tem o trauma do golpe. Aqui no Chile os militares são diferentes”. Três dias depois entrava numa embaixada…
Hoje, 1/3/2018, Veríssimo e até Míriam Leitão, em O GLOBO, acendem luzes vermelhas. Mais diretamente, Bernardo Mello Franco, numa coluna de título ambíguo: “Os militares no poder”. Ele narra a homenagem ao general Mourão que passa para a reserva. Na ocasião, este chama Brilhante Ustra de herói, um torturador notório durante a ditadura. É saudado por seu chefe, o general Villas Boas, que recentemente pedia poderes amplos na área da segurança, para não correr o risco de, no futuro, enfrentarem “comissões da verdade”, o que quer dizer, impunidade antecipada a atos repressivos. Um pequeno grupo ultra? Em lugares estratégicos, como o pouco visível general Etchegoyen, Ministro-Chefe do Gabinete de Segurança, figura forte no Planalto, neto, filho e sobrinho de generais da linha dura no passado. O que está levando O Globo a chamar a atenção para um perigo? Há no texto de Mello Franco uma menção a FHC, sempre bem informado e sibilino: “Governos, sobretudo quando não são fortes, apelam para os militares”. E Mourão disse que Temer deveria ser expurgado da vida pública. Até nos setores dominantes há sinais de alarme. O que eles têm na manga em contrapartida? Aviso para o PSDB tomar cuidado? Nomes são lançados ao acaso: Alckmin, Luciano Huck (!)… O escorregadiço presidente da Câmara mordido pela mosca azul?
Tenho insistido ao cansaço, sem medo de repetir o bordão, na necessidade de uma Frente Ampla nacional, popular e democrática das forças progressistas. Está difícil, numa esquerda que parece pensar nomes e não projeto. Deveriam buscar o exemplo de Portugal, como lucidamente nos ensina Boaventura de Sousa Santos. No Chile, surge como terceira força uma frente capitaneada por jovens, como no passado a Frente Amplia no Uruguai ou, mais recentemente, Podemos na Espanha. Aqui temos poucos meses para as eleições e cada partido parece fechar-se no seu casulo. Lula é a liderança mais forte no país, e tem todos os méritos e popularidade para candidatar-se a presidente. Entretanto, os interesses de uma elite de matriz escravocrata (ver Jessé de Souza, Escola Tuiuti) tentam querer tirá-lo do páreo. Ironicamente, talvez pela ficha limpa, grande conquista democrática. Nesse caso, ele certamente poderia ser um forte eleitor, na articulação de uma grande frente democrata e antigolpista. Possível? Sonho de um cristão ingênuo?
Há que apostar num trabalho plural de longo prazo, mas agora temos pela frente um desafio imediato, para reconquistar avanços em regressão e abrir novos horizontes. Minha geração saiu proclamando: “O petróleo é nosso”. Hoje poderíamos dizer: “O pré-sal é nosso”. Defender os interesses populares em perigo com falsas reformas, elaboradas a partir de dados manipulados e enganadores. Exigir o fim de uma política internacional entreguista.
Luiz Alberto Gomez de Souza, sociólogo político.