É com indignação e dor que nos somamos, como CESEEP – Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e Educação Popular, à nota da Comissão Brasileira de Justiça e Paz e ao CONIC e choramos junto com as mães que tiveram seus filhos brutalmente assassinados, com requintes de crueldade e desumanidade. O Estado vem se transformando num Estado assassino tanto na pandemia como nas ações policiais açuladas pelos responsáveis maiores do país.
Veja a seguir notar completa na íntegra.
NOTA PÚBLICA SOBRE CHACINA EM JACAREZINHO/RJ
Nota Pública – A pena de morte vigora no Brasil, sem julgamento e sem vergonha!
“Todo o ser humano tem direito de viver com dignidade e desenvolver-se integralmente,
e nenhum país lhe pode negar este direito fundamental. (…).
Quando não se salvaguarda este princípio elementar,
não há futuro para a fraternidade nem para a sobrevivência da humanidade.”
(Papa Francisco, Fratelli Tutti, nº 107).
Às margens dos rios da Babilônia, sentamos e choramos (Sl 137.1)
Às margens do Rio: nas vielas, nos becos, na favela, sentamos e choramos, levantamos e gritamos. No dia 6 de maio de 2021, a partir das 6h45, em ação ilegal e com fortes sinais de extermínio, as Polícias Civil e Militar do Rio de Janeiro invadiram a Comunidade do Jacarezinho. Um policial civil foi morto. Segundo os moradores, depois disso os policiais passaram a se comportar de modo ainda mais violento. A consequência foi o assassinato de 24 pessoas da comunidade, em sua maioria negras. As cenas registradas por moradores indicam que a ação policial foi semelhante a de um grupo paramilitar. Os relatos revelam que pessoas foram brutalmente torturadas, casas invadidas e moradores espancados. Vídeos mostram uma pessoa baleada, sem condições de reação, sendo executada por policiais.
É responsabilidade do Estado do Rio de Janeiro, de seu governador, recém-empossado, e de sua equipe de secretários de estado o descumprimento da ordem do Supremo Tribunal Federal que suspende operações policiais durante a pandemia. Surge imediatamente a pergunta: Quem irá apurar as ações para evitar a perícia? Quem responderá pela tentativa de alteração e destruição das cenas do crime? Quem responde pela retirada das pessoas mortas em carros blindados?
Esta chacina foi provocada pelo Estado do Rio de Janeiro, via forças da segurança pública. Segundo o Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos da Universidade Federal Fluminense, esta é a chacina provocada pelo Estado com o maior número de mortos. Não há justificativa para tamanha violência. O Estado, quando permite ou autoriza suas polícias a agirem desta forma se transforma, em cada um desses atos de extermínio, em organismo violador dos Direitos Humanos fundamentais. Ele se distancia de sua finalidade maior, que é o de proteger incondicionalmente a vida de todas as pessoas. Nada distingue um Estado quando age ilegalmente, por meio de sua força de segurança, de uma organização criminosa.
Basta! Não é possível continuar com o racismo institucional que assassina pessoas negras. A radicalidade da violência praticada por agentes do Estado, em cumplicidade com seus superiores, exige que a sociedade reveja urgentemente a sua política de segurança pública. As pessoas responsáveis por este crime, em especial, o alto escalão, responsável por dar as ordens, precisam ser responsabilizadas.
A reconstrução de nossa sociedade exige a desmilitarização da polícia com sua formação permanente em direitos humanos para que agentes da segurança pública não sejam os principais violadores destes direitos.
Instamos o Congresso Nacional, o Supremo Tribunal Federal, a Procuradoria-Geral da República, a Defensoria Pública da União, a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e a Câmara Municipal do Rio de Janeiro a tomarem as iniciativas e todas as medidas necessárias para fazer cessar, imediatamente, a violência policial orientada pelo racismo e pela aniquilação das pessoas pobres, especialmente em áreas de favelas e periferias.
Denunciamos esta chacina à Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Exigimos que todas as medidas necessárias sejam tomadas para uma investigação independente deste crime e que a comunidade do Jacarezinho tenha o direito à reparação. Por fim, que o Estado garanta o direito das famílias enlutadas de reconhecerem e enterrarem seus mortos com dignidade, além de receberem todo o acompanhamento psicossocial.
Manifestamos nossa solidariedade às famílias das vítimas e às organizações sociais e comunitárias. Seguiremos vigilantes contra as violações dos Direitos Humanos e da Natureza no país.
Brasília/DF, 7 de maio de 2021.
CBJP – Comissão Brasileira Justiça e Paz
CONIC – Conselho Nacional de Igrejas Cristãs
CESEEP – Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e Educação Popular