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Horta Comunitária do Itajaí: entre a geração de emprego e renda e a alimentação saudável

 

“Vi ontem um bicho

Na imundície do pátio

Catando comida entre os detritos.

Quando achava alguma coisa,

Não examinava nem cheirava:

Engolia com voracidade.

O bicho não era um cão,

Não era um gato,

Não era um rato.

O bicho, meu Deus, era um homem.”

 (Manuel Bandeira)

 

A horta comunitária do Parque Itajaí, na cidade de Campinas, surgiu da necessidade de se aproveitar a mão-de-obra desempregada da cidade, com especial atenção para idosos e deficientes para que se mantivessem limpas e utilizadas áreas ociosas ou não aproveitadas na periferia da cidade tais como logradouros e praças não afetadas ao uso comum do povo.

À época, nos anos dois mil, estava-se discutindo em nível nacional a construção do Programa Fome Zero, cujos elementos já vinham sendo implementados em Campinas pelo Governo Popular do Partido dos Trabalhadores liderado por Toninho e Izalene Tiene (2000-2004). A concepção de horta comunitária para a geração de alimentos sustentáveis e renda na periferia vinha ao encontro das premissas do referido programa.

Pode-se localizar também na Lei Municipal 9549/97 que criava o Programa Municipal de Horta Comunitária no Munícipio de Campinas, de autoria do então vereador Carlos Signorelli (PT/SP), um outro estímulo para que os moradores da região do Campo Grande em Campinas encontrassem amparo legal para colocarem em prática o projeto de implantação da horta comunitária. 

A regulamentação desta lei pela então Prefeita Izalene Tiene (PT/SP), por meio do Decreto nº 14.288, da de 11 de abril de 2003, constitui-se como mais um passo no sentido de criar um arcabouço legal para que o coletivo de moradores do Parque Itajaí pudesse iniciar os trabalhos da horta comunitária. A importância desse decreto está no fato de criar a “Comissão Gestora do Programa de Hortas Comunitárias de Campinas”, com a função de fazer –  de acordo com o texto da lei – “a definição das políticas públicas de gestão, assessoramento, orientação e aprovação da necessária distribuição de água, sementes e outros implementos agrícolas com recursos oriundos de convênios firmados pela Municipalidade”. 

Interessante esta constatação porque o processo de construção da Horta Comunitária do Parque Itajaí em Campinas articula de forma muito inovadora a mobilização popular e a luta parlamentar. Em outras palavras, ao mesmo tempo em que no bairro periférico os moradores se mobilizavam para colocar em prática um projeto coletivo de geração de alimentos e renda, do mesmo modo, de forma sincronizada, no Parlamento e no Executivo Municipal, as reinvindicações encontraram respaldo e amparo em um vereador (Carlos Signorelli) e em uma Prefeita que conheciam a causa popular em questão e não mediram esforços não somente em apoiar o projeto mas avançaram no sentido dar a ele uma fundamentação legal criando um Programa de Hortas Comunitárias na cidade, permitindo a existência futura de inúmeros outros projetos de iniciativa popular.

Graças a esse processo, hoje, em qualquer lugar da cidade de Campinas, movimentos sociais, associações de moradores, coletivos populares, escolas, igrejas, dentre outras organizações, podem construir hortas comunitárias ocupando vazios urbanos e áreas degradadas e abandonadas gerando renda e alimentação saudável.

De acordo com Sr. Orlando, uma das pessoas que está desde o início na organização da Horta Comunitária do Parque Itajaí 3 e 4, lá se faz o cultivo de alface, almeirão, quiabo, jiló, berinjela, chuchu, abóbora entre outras hortaliças. O plantio é orgânico, ou seja, não utiliza agrotóxicos nem produtos químicos. Os alimentos são utilizados para consumo das famílias responsáveis pela horta e vendidos para os moradores da região, uma alternativa de renda. A atividade também ajuda a recuperação de uma área degradada da Bacia do Rio Capivari, rio que corta a região do Campo Grande, periferia de Campinas.

Orlando destaca também o protagonismo do Sr. João Novaes, outra liderança importante na realização do projeto da horta comunitária. O protagonismo e a ousadia dele foram fundamentais para trazer outras pessoas para o projeto. Segundo se conta na região, Sr. João começou sozinho a colocar as mãos na massa, ou seja, roçar o mato e fazer os canteiros. Depois, impactados pelo seu exemplo outras pessoas se aproximaram e deu-se início ao coletivo que deu organicidade ao projeto.

A Horta comunitária do Parque Itajaí, na periferia de Campinas já conquistou menções honrosas e prêmios no `âmbito municipal e federal por tratar-se de uma iniciativa popular e comunitária de geração de renda e produção de alimentos orgânicos, promovendo renda para muitas famílias e alimentação saudável para inúmeras outras.

Arnaldo Valentim Silva, é educador popular e Diretor de Escola Estadual na Cidade de Campinas.

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