Estamos na semana de eleições presidenciais, eleições para o Congresso e também para o governo dos Estados e assembleias estaduais. Não são poucos os candidatos que recorrem a Igrejas para se elegerem e há grupos que pensam que cristão deve votar em cristão. Conforme o evangelho e a ética da fé, não deve ser esse o pensamento. Como diz Jesus no evangelho:
“Não é quem diz Senhor, Senhor, que entra no reino dos céus, mas quem faz a vontade do Pai” (Mt 7, 21).
O critério para eleger alguém não pode ser se a pessoa é de tal Igreja ou religião e sim se, de fato, se propõe a servir às boas causas de todo o povo. Como vivemos em um país desigual e dividido, é importante que escolhamos pessoas que ajudem a tornar o Brasil mais justo, menos desigual e as classes empobrecidas possam ter sua cidadania reconhecida.
As eleições nada têm a ver com Igrejas, mas têm sim a ver com Espiritualidade. Não se pode dividir a vida em material e espiritual, nem reduzir a fé a algo íntimo e apenas religioso. Se a Política e a Espiritualidade não se encontrarem, a Política vira politicagem e a espiritualidade se torna somente devoção privada e intimista.
Temos de redescobrir e valorizar a dimensão política da espiritualidade, assim como redescobrir a base espiritual da Política. A nossa busca espiritual do Amor Divino tem de se manifestar no modo como exercemos nosso compromisso de cidadãos e cidadãs de uma pátria e de uma cidade.
Não é verdade que a Política é assunto que não se discute. Menos ainda é justo afirmar que nenhum político presta. É ingenuidade dizer: “Não gosto de Política”. Todos nós fazemos política quando convivemos em sociedade e exercemos alguma função social.
De fato, muitos entram na Política profissional para se beneficiarem individualmente. Esses servem a interesses seus ou do grupo que os pagam e não às causas do povo. No entanto, existe, sim, uma minoria que pede os nossos votos para representar o povo e garantir o direito de todos.
No próximo dia 14, o papa Francisco vai canonizar Monsenhor Oscar Romero, arcebispo de El Salvador. Assim, o papa reconhece publicamente que Romero deu a vida para defender os pobres e lutou até o fim pelo que ele chamava de “dignidade da Política”, como serviço ao bem comum.
No Brasil, essas eleições estão muito polarizadas. Para votar com coerência espiritual, é preciso ser dócil ao Espírito de Deus em nós e não seguir critérios de interesse pessoal, de família ou votar apenas por relação de amizade. O nosso voto pode ajudar a construir uma sociedade mais justa.
No entanto, ao contrário, pode também perpetuar os velhos vícios do sistema vigente. Não estamos em uma sociedade ideal e todos os partidos têm falhas.
No entanto, é importante discernir entre as diversas escolhas possíveis, a escolha que nos parece ser a mais justa e adequada para o bem comum e as causas dos mais pobres.
Quem tem fé em Deus ou simplesmente na Vida não deveria dar o seu voto a quem prega discriminações sociais, faz diferenças de direitos entre homens e mulheres e revela claramente intolerância contra minorias sexuais.
Os Evangelhos contam que, ao entrar em Jerusalém, Jesus foi ao templo e ali, com um chicote em punho, expulsou os cambistas e vendedores de animais para os sacrifícios. Esse gesto anunciava que, a partir de Jesus, a nossa relação com Deus não precisa de templos nem de sacrifícios.
No entanto, essa cena de Jesus expulsando do templo os comerciantes pode também servir como símbolo para a Política. A atividade política deve ser vista como novo templo divino, como espaço formador da dignidade coletiva de um povo. Por isso, é preciso sempre de novo expulsar dela os vendedores que a diminuem e a envergonham.
Hoje, o chicote com o qual podem ser expulsos da política os que a reduzem a um negócio de interesse e mercado só pode ser o voto consciente e ético de cada cidadão/ã.
O evangelho diz que devemos julgar as pessoas e partidos conforme a prática e pelos seus resultados.
“Pelos frutos bons, vocês podem discernir que a árvore é boa, assim como pelos maus frutos, verão que uma árvore é má. Pelos frutos, vocês podem discernir se a árvore é boa ou má” (Mt 7, 18).
Marcelo Barros, monge beneditino, teólogo e biblista, assessor das comunidades eclesiais de base e de movimentos sociais. Tem 55 livros publicados, dos quais o mais recente é “Conversa com o evangelho de Marcos”. Belo Horizonte, Ed. Senso, 2018.
Deveria se candidatar, fala como eles! Um monte de abobrinha que não dá em nada!